KOSI EWE, KOSI ÒRÌSÀ
(Sem Folhas, Sem Òrìsà)
Osanyìn, o ÒrÌsà patrono da vegetação e divindade das folhas litúrgicas e
medicinais. É cultuado nos terreiros Lèsè Òrìsà, Lèsè Egungun e Lèsè Ifá, durante o processo iniciático quando banhos, atin (pós) e “descarrego” são feitos com o auxílio das folhas. Sua importância é tão abrangente dentro da religião africana que nenhuma cerimônia pode ser praticada sem a sua participação, pois sendo o detentor do àsë contido nos vegetais, todos os Òrìsàs dependem dele, por isso diz-se: sem folhas não tem òrìñá - Kosí ewé kosí Òrìxá.
O sistema de classificação dos jêje-nagôs, que diz respeito aos vegetais, se
estrutura sobre quatro elementos que esotericamente é visto como universal,
Fogo, Água, Terra e Ar.
Sendo os Òrìsà, representações vivas destas forças que regem a natureza, as
folhas a eles atribuídos, no contexto litúrgico, associam-se, conseqüentemente, a estes elementos. Deste modo, os vegetais estão dispostos em quatro compartimentos-base diretamente relacionados aos quatro elementos da natureza:
No compartimento Fogo estão inseridas as Ewé inan(Folhas do Fogo)
No compartimento Água estão as Ewé Omí (Folhas da água)
No compartimento Terra estão as Ewé Ile (Folhas da terra)
No compartimento Ar estão as Ewé Afefé(Folhas do Ar)
Nestes quatro compartimentos-base, insere-se todo o sistema liturgico jêje-nagô. Sendo assim, cada òrìñà possui uma característica própria que é transmitida ao seu iniciado, o que possibilita identificar, através do arquétipo humano, seus pais míticos, ou seja, qual o ÒrÌsà que rege a pessoa. Deste modo temos:
Orixás relacionados ao Fogo: Exu Xangô e Oiá
Orixás relacionados a Água: Yemanjá, Oxún, Oba, Oyá, Ewá, Oxumaré, Nàná,
Oxosi, Òxàlá
Orixás relacionados a Terra: Osanyin, Ògún, Odè, Omolu
Orixás relacionados ao Ar: Òxàlá, Oxumaré e Oyá.
A divisão do óríxá em caminhos ou passagens por tribos diferentes (que no Brasil denominamos de qualidades do Òrìsà) faz com que estes pertençam a mais de um compartimento. Ex.: Exù que se relacionam com todos os orixás; Ògún e Odè que vivem na água; Oyá que possui caminhos de fogo, água, mato; Oxumaré que transita entre o céu, a terra e as águas etc.
Os vegetais se dividem, também, dentro de um sistema binário, em
Masculinos e Femininos que são determinadas pela forma de suas folhas:
Folhas alongadas ou que possuem forma fálica são masculinas.
Folhas arredondadas ou que possuem forma uterina são femininas.
As folhas consideradas masculinas estão associadas aos orixás masculino, bem
como as femininas, aos orixás femininos, todavia, aventualmente encontraremos algumas folhas femininas usadas para orixás masculino e algumas masculinas utilizadas para as ìyába, o que reflete a própria relação familiar dos orixás masculinos com femininos e vice versa. Como exemplo vemos que, sendo Ògún filho de Yemanjá, as folhas femininas usadas para esta ìyába é freqüentemente usada para este orixás e vice versa (como já disse, no Brasil fazemos alusão a qualidades de santo, então mediante tal circunstância deve ser observado tal acasião). Dentro, ainda de uma visão binária, os jêje-nagô consideram, ainda que as folhas podem estar posicionadas no lado direito - Ewé apa otun - que é masculino e
positivo em oposição ao esquerdo - Ewé apa osí - que é feminino e negativo.
Os compartimentos que contem as ewé inan (folhas do Fogo) e ewé Afeefe
(folhas do Ar) estão associados ao masculino, elementos ativo e fecundantes.
As ewé omín (folhas da Água) e as ewé Ilé (folhas da Terra) se ligam ao feminino, elementos passivos e fecundáveis.
Todavia, essa não é uma condição “sine qua non” quando analisamos mais
detalhadamente a utilização dos vegetais, pois, percebemos que algumas folhas positivas se relacionam com o lado esquerdo ou feminino e vice-versa, daí, encontrarmos folhas femininas usadas com fins positivos e folhas masculinas consideradas negativas. Verger (1995:25) cita, pôr exemplo, “que entre as folha há quatro conhecidas como (...) as quatro folhas masculinas (pôr seu trabalho maléfico)...; e quatro outras tidas como antídotos...”. Entre estas últimas êle inclui o òdúndún (Kalanchoe crenata), que é uma folha feminina, porém, positiva, o que nos faz crer que as diversas condições binárias não interagem de modo rígido entre si, mas sim transitam dinamicamente de um lado para o outro, pois, como vimos, uma folha masculina pode estar situada junto aos elementos da esquerda pôr ser considerada negativa e vice-versa.
De grande importante, também, na classificação dos vegetais são as condições
binárias gún (de exitação) x éró (de calma), pois, são aspectos das folhas, que
dão equilíbrio às misturas vegetais, quando bem dosadas de acordo com a
situação de cada indivíduo. Os vegetais considerados gún estão ligados aos
compartimentos Fogo ou Terra, enquanto que, os considerados éró, relacionam-se com as folhas da Água ou Ar. Estas condições são interpretadas corriqueiramente pelas pessoas do candomblé como fria (eró) ou quente (gún).
Quando utilizadas nos rituais de iniciação ou nos trabalhos litúrgicos, os vegetais classificados como éró em a função de abrandar o transe, apaziguar ou acalmar o Òrìsà, contrariamente, os considerados gún servem para facilitar a possessão e excitar o Òrìsà.
Os vegetais gún e éró são identificados, normalmente, segundo seu nome ou sua finalidade:
Ex: Tîtî (folhas fresca) eró
Rinrin (folha úmida) eró
Pèrègún (Provoca o transe) – gún
Tîtîrîgún (Que produz transe) – gún
Iroko (Produz calma) eró
Ewé ina (Folha de fogo) gún
È importante notar que o ofó (encantamento) é que determina a função da folha, pois, embora exista todo um sistema classificatório para os vegetais, cada folha traz em si a função a qual ela se destina. Como exemplo: Peregún que no seu ofó é considerado o senhor da maldição, tem a finalidade de retirar maldições das pessoas.
Ewuro, a folha amarga, tem por função retirar o amargo da vida.
Teté, Rinrin e Odundun são folhas calmantes mas, também, com função de atrair prosperidade para seus usuários.
“Ewé njé Oògún njé Oògún tikò jé Ewé re í kò pé”
“As folhas funcionam. Os remédios funcionam. Remédio que não funciona é
porque faltam folhas”.